A crise financeira e económica resulta de erros de gestão do capital e do trabalho. Deficiente planificação dos gestores públicos e privados, políticos ou não levou-nos a uma situação calamitosa que, na minha opinião, vai ser impossível de ultrapassar. As razões, que sustentam o meu raciocínio, são muito simples.
Primeira, o capital não está interessado no trabalho, embora dependa dele, despreza-o e explora-o. Nunca como agora as empresas se estão a aproveitar do momento para contratar pessoal qualificado ou não, pagando-lhes o mínimo salário possível. Exigem tudo e não pagam ao trabalhador o que é justo, as horas extraordinárias e dentro do prazo definido por lei. Não se preocupam em reorganizar, rentabilizar e potencializar recursos disponíveis. A produção máxima a custos reduzidos permitindo uma elevada faturação é o seu único objectivo.
Segunda, o setor financeiro investiu muito mais capital no estrangeiro do que cá. Logo, o dinheiro saiu muito mais do que entrou. O investimento em Portugal está condenado por causa das nossas leis e da sua aplicabilidade, da burocratização dos processos e da reduzidíssima celeridade da justiça. O despesismo do estado em obras públicas desnecessárias criou postos de trabalho precários e temporários, mas hipotecou as finanças para o resto das nossas vidas.
Terceira, o trabalho é que está a pagar a crise, ou seja, é ao rendimento do trabalho que se vai buscar receita em impostos ou contribuições para corrigir o esbanjamento do lado da despesa pública e privada. Sacrifica-se o contribuinte para obter receita imediata e não se combate a despesa do estado e das empresas.
Quarta, o endividamento das famílias é muito elevado quer por culpa própria, quer por irresponsabilidade, mais uma vez, do setor financeiro. A obsessão constante das instituições bancárias e seguradoras em apresentar lucros consecutivos influenciou e pressionou os particulares e as empresas a aderir a produtos que as suas contas correntes não podiam suportar.
Quinta, o uso da política para a promoção financeira e social atingiu níveis nunca vistos. Os políticos não servem a política, mas servem-se dela. O servir a causa pública é pura retórica. O compadrio, o tráfico de influências e a corrupção estão profundamente enraizados na nossa sociedade e nunca deixarão de existir. A promiscuidade entre o estado e as empresas atingiu limites impensáveis, onde a circulação bilateral sem pudor de pessoas e bens é escandalosa.
Sexta, os salários são baixos relativamente ao custo de vida, os aumentos salariais e as progressões nas carreiras estão congeladas e não se vislumbra quando deixarão de estar. Os impostos aumentaram e os benefícios fiscais e sociais diminuíram, o custo de vida aumenta, o desemprego não diminui, a economia não cresce.
Sétima, se não se imputa responsabilidade civil e criminal aos gestores pela contabilidade durante o período em que permanecem nos cargos, quem é que tem vontade de trabalhar? Porquê? Porque devemos ajudar a recuperar um país em que o povo muito pouco contribuiu para o seu estado actual? Para quê? Para entregar a gestão dos dinheiros públicos a indivíduos academicamente incapazes que só buscam a sua ascensão pessoal?
Oitava, os sacrifícios não são para todos, são mais para uns do que para outros. Não são para todos, porque o capital não está a contribuir com mais impostos para reduzir a crise como devia. Mais para uns do que para outros, porque uns são sobrecarregados com reduções salariais e perda de “metade” do subsídio de natal e outros não.
Em face disto tudo, quem é que tem motivação para trabalhar? E, por favor, não me venham com essa falácia de que temos que ajudar a recuperar o país. Quem assim fala, normalmente, pouco trabalha ou ganha acima da média. A crise já há muito tempo afetou a vontade de fazer mais, de melhorar. As pessoas só querem sobreviver ao trabalho e à sua vida, elas já não aspiram a mais nada. Não as martirizem mais, sacrifiquem-se “vocês”.
Vontade de trabalhar, onde andas tu? Procuro-te por todo o lado, mas não te encontro.
Imagem (daqui) e (daqui)